Manhã sem ar

Eduardo Barchiesi
2 min readMar 1, 2020

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prisioneiro nesta carcomida carcaça de mim

dou uma parada no caminho aqui pelo meio

do lixo não reciclável recolho bola de cristal

com a óbvia intenção de saber qual meu fim

encerrado neste nojento curral de chão batido

limitado espaço a gado a espera de ser abatido

plausivelmente dentre o grupo dos não inocentes

tenho como companheiras inseparáveis moscas

não adianta mandar sacerdote trazendo extrema-unção

de antemão adianto não vou me fingir de arrependido

justamente eu que fui cem por cento do tempo enganado

como mais um ilustre viageiro bocó em busca do eldorado

em vista disso a partir de agora vou parar de andar de carro

andarei de bicicleta pelo corredor de ônibus cuspindo catarro

me imiscuo na multidão passo por outro vilão sem dificuldade

porque deveras sou arrogante me faço de completo ignorante

das desditas sofridas por mim e todos os meus semelhantes

deste nosso bando de humilhados espalhados pela cidade

pena não aceitar como sugestão de pena punhal

cravado no peito muito menos pedrada na cara

dou preferência a revólver com bala encontrada

tenazes nos bagos não por favor não acho legal

ter um fim decente como merecem alimárias quaisquer

tais pombas piolhentas pululando a metrópole é a meta

ou também por exemplo os restos de melancias na feira

enfim como todo vivente dependente de oxigênio quer

considero que seja justo talvez ter ao menos esse direito

razão pela qual o digo com transparência quase perfeita

enquanto isso permaneço nesta casa assombrada

embora fique num beco sem saída

aqui o terror não tem entrada

apenas de vez em quando o bem pelo mal é superado

se um ou outro transeunte passante diante da porta

exprimisse olhares incompreensivos em cara torta

devido à ausência de luz do crepúsculo ao amanhecer

se visse o preço do quilovate hora iria compreender

já estou acostumado sequer me sentiria surpreendido

caso numa noite dessas uma daquelas bem escura

a morte viesse à minha procura

e ao nascer do sol fosse encontrado no chão estendido

nem alegre nem triste sem piedade ou dó

rijo e só

http://eduardobarchiesi.blogspot.com.br/

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Eduardo Barchiesi
Eduardo Barchiesi

Written by Eduardo Barchiesi

Poetastro perdido no próprio rastro

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